Guardian e a memória alheia

Enquanto navegava pelas notícias do jornal Guardian, uma delas me chamou atenção por a memória usada não ser a do próprio veículo. Esse tipo de referência é chamada de intertextual (quando se faz alusão a uma notícia exterior ao veículo), para diferenciar da intratextual (uma espécie de autorreferência).

No exemplo, a notícia do Guardian indica ao leitor uma reportagem publicada um dia antes no Los Angeles Times. O interessante nesse tipo de uso da memória é o fato de o jornalista não se prender apenas ao seu veículo e demonstrar um conhecimento maior e até um reconhecimento do trabalho realizado em outros jornais.

Nos (web)jornais brasileiros de modo geral, temos a impressão que os jornalistas leem apenas os produtos da própria empresa. Seja porque não possam citar outros meios ou porque realmente preferem se fechar na produção de seu veículo, o fato é que há pouca citação entre os portais – sobretudo os das grandes empresas de comunicação. Isso levando em consideração que o próprio jornalista é quem produz as ligações no seu texto (pois há ainda a memória interligada “fora” da narrativa – mas isso é um assunto que fica para depois). Será mesmo que o outro não produz um material de qualidade a ponto de ser citado?

Quando encontramos links intertextuais (na definição que empregamos ao termo) em portais brasileiros,  geralmente é porque o texto advém de alguma agência de notícia ou de um portal afiliado (é o caso de portais regionais citando como fonte os nacionais), logo, é apenas explicitada a fonte. A indicação para ampliar e continuar uma leitura sobre o tema geralmente é para o mesmo veículo ou para outro da mesma instituição, empresa, editora etc. Caberia pensar se neste último caso a relação seria ainda intertextual, pois o leitor “sairia” do veículo, mas não do produto da instituição em que o jornalista trabalha.

Esses apontamentos são apenas primeiras impressões de observações assistemáticas, para tentar entender melhor a relação jornalismo e memória. Também não sei se é rotineiro Guardian citar outros veículos, tentemos descobrir e debater.

3 thoughts on “Guardian e a memória alheia

  1. Pingback: A (não) utilização da memória no Estadão e no Público « Recurso Mnemônico

  2. Salve, pujante Allysson! Olhe, acho que o interesse/ limite é empresarial/ institucional mesmo, não remeter ao possível concorrente. Agora, o outro dado me parece ligado ao que que ontem um colega jornalista me falava e lembra o meu tempo de prática jornalística: jornalista frequentemente não tem tempo de ler (ou não se organiza para tal). Nem jornal.

    • Acho também que o problema dos meios de comunicação no Brasil pode ser esse medo de perder leitor, da concorrência. Mas essas são primeiras impressões, pode ser até que ocorra o mesmo nos portais e jornais de fora. Ou mesmo que os daqui cheguem a utilizar a memória das outras mídias mais do que os do exterior.

      E se jornalista não lê, há algum problema aí. Isso me preocupa mais ainda porque alguns pesquisadores – como Mike Ward em Jornalismo Online – afirmam que “webjornalistas consomem outras mídias. Até mesmo leem livros”. E se começamos a dizer que os jornalistas de outros meios não leem, mas os da web sim, caímos numa supervalorização que não é legal.

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